sexta-feira, junho 01, 2012


Mil e quantas mais



Texto e foto de Valéria del Cueto
Vou começar, antes que acabe. É isso mesmo. Acabe o tempo para entregar ao diagramador mais uma crônica, ainda da Ponta do Leme (sentiu o quase movimento?).
Hoje é sexta feira, mas cá entre nós não parece! O tempinho chinfrim que se espalhou pelo Brasil chegou a minha beira mar, deixando um céu chumbento, sem atrativos com um ventinho vagaba e implicante. Ele não para de despentear meus cabelos que se encarregam de fazerem cócegas na ponta do meu nariz alérgico da mudança. Já deu pra avaliar o nível de concentração do início da tarde. Zero.
O mar baixou um pouco, mas ainda está mexido reflexo da última ressaca que, entre outras coisas, carregou dois viventes imprudentes e desprevenidos do Caminho dos Pescadores, na Pedra do Leme.  Foram fisgados de volta à terra firme, machucados e molhados, pelo Corpo de Bombeiros. Aqueles heróis de sempre, no lugar certo como sempre, mal pagos sempre.
Quando fincaram a placa avisando que a correnteza estava perigosa, ainda havia ele - o sol - e o céu estava azul, mais que a cor do mar. Mas isso foi antes. 
Agora, tá tudo cinza, com ou sem você. Nada animador. Ou melhor, muito inspirador pra gente ficar na caminha  lendo um bom livro, vendo um filme e, por decorrência, comendo pipoca enroladim num edredon.
Diz que pras bandas de Cuiabá a neblina tomou conta do entorno e invadiu até as almas mais poderosas. Pela foto que recebi do meu serviço particular de meteorologia local vai ser ruim o cuiabano  botar a cabeçinha pra fora da soleira de sua residência... Quem me manda as fotos diárias que me mantém informada e localizada na temperatura básica de Cuiabá é o mesmo ser bondoso que, esta semana, atingiu a marca das 1000 crônicas publicadas  nos jornais, blogs e sites espalhados pelo Brasil, o magnífico Gabriel Novis Neves.
Lembro quando ele começou a escrever. Certamente nunca lhe passou pela cabeça que seria uma Sherazade cuiabana e, em tão pouco tempo, alcançaria suas mil e uma histórias. Hoje responsáveis por manter, não um boi, mas uma boiada inteira de leitores atentos e interessados no que ele tem para dizer. Fantasia, ou não. E olha que a caixa de Pandora aberta nessas crônicas expos uma fresta da imensa cultura e dos variados interesses que movem o cronista em tela. Foi uma surpresa para muita gente.
Num primeiro momento, a novidade se espalhou e ele fisgou os aficionados pelo seu estilo literário direto e enxuto que, um dia me explicou, envolvia uma apresentação do assunto, a anamnese e, finalmente, um possível diagnóstico. Coisa de médico. Competente.
Com o passar do tempo, quem foi acompanhando o conjunto da obra, começou a reparar que os textos curtos poderiam ser ligados entre si e, aí, as histórias (que poderiam ser para boi dormir) passaram a ter um significado complexo e contundente. Alguns acharam que ele havia enlouquecido. Outros, que estava indo longe demais ao colocar na roda o que achava dos acontecimentos que agitam a comunidade em que vive... Não houve pressão que desestimulasse o autor. Ele prossegue cutucando, informando, questionando e procurando respostas para as questões que afligem, não apenas a ele, mas a sociedade como um todo.
Por isso, acredito que essas histórias ainda serão contadas por muitas e muitas crônicas. Daquelas que nos estimulam e fazem pensar no que somos e para onde vamos. Como essas são respostas ainda distantes de serem alcançadas, cabe a nós, não apenas buscá-las instigados pelo autor, mas na medida em que qualquer luz seja jogada sobre elas, fazer o possível para divulgá-las para o maior número de pessoas possível.
Admiro este percurso e procuro seguir este caminho  numa frequência exponencialmente menor. O que sempre o fará maior. Ser cronista aprendiz não é fácil...

*Valéria del Cueto é jornalista, cineasta e gestora de carnaval. Esta crônica faz parte da série “Ponta do Leme” do SEM FIM

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